A Covid-19 afeta principalmente o sistema respiratório, apresentando sintomas como febre, tosse, dor de garganta, coriza, cansaço, perda de paladar e olfato. No entanto, alguns pacientes também relatam sintomas gastrointestinais, como náuseas e diarreia.
Estudos apontam que o desequilíbrio da microbiota intestinal pode estar associado à gravidade da infecção e à persistência de sintomas da doença. O trato gastrointestinal é o maior órgão imunológico do organismo e os micro-organismos que vivem nele podem dificultar o processo de recuperação da doença.
A partir disso, pesquisadores da Universidade Chinesa de Hong Kong investigaram se a microbiota intestinal está relacionada à covid-19 longa, analisando a composição do seu microbioma e o código genético dos microrganismos. Para realizar o estudo, foi feita uma seleção de voluntários diagnosticados de Covid-19 por meio do teste PCR-RT.
A covid-19 longa foi classificada com a permanência de pelo menos um sintoma após quatro semanas da eliminação do vírus no organismo. No total, foram avaliadas a presença de 30 sintomas mais relatados de 3 a 6 meses pós-covid.
Após 6 meses de alta, a fim de realizar uma avaliação funcional simples da resistência aeróbica, os pacientes foram submetidos a um teste de caminhada por 6 minutos. Os resultados foram correlacionados com a análise da microbiota intestinal.
Como a alimentação pode afetar a microbiota, também foram registrados os hábitos alimentares de todos os pacientes com covid-19 durante o período de hospitalização. Foram fornecidas refeições padronizadas e depois de terem alta, eles foram aconselhados a manterem uma alimentação chinesa habitual e diversificada.
A pesquisa foi feita com 106 pacientes que tiveram a doença, acompanhados desde a admissão, até 6 meses após a alta, e com 68 indivíduos não infectados, entre setembro e novembro de 2019. Um total de 258 amostras de fezes foram coletadas e seu material genético sequenciado para realizar a análise do microbioma.
Como a microbiota intestinal pode influenciar a covid-19 longa
Os resultados da pesquisa apontam que o perfil do microbioma intestinal pode afetar a suscetibilidade à covid-19 longa. Os participantes tinham em média 48 anos e 56 deles (52,9%) eram mulheres. A maioria teve covid-19 de leve a moderada (81,1%).
A covid-19 longa foi constatada em 86 (81,1%) e em 81 (76,4%) pacientes após 3 e 6 meses da alta hospitalar. Dos 106 pacientes diagnosticados com a doença, 47 tiveram amostras de fezes coletadas na admissão, 64 com 1 mês e 68 com 6 meses. Entre estes últimos, 50 tiveram covid-19 longa.
Entre os sintomas mais comuns relatados, identificam-se: fadiga (31,3%), memória fraca (28,3%), queda de cabelo (21,7%), ansiedade (20,8%) e dificuldade para dormir (20,8%).
Não foram encontradas diferenças significativas com relação à idade, sexo, comorbidades, uso deanalgésicos e gravidade da doenças em pacientes com ou sem covid-19 longa aos 6 meses.
Embora a carga viral não tenha apresentado associação com a covid-19 longa, a composição do microbioma intestinal de pacientes nesse quadro foi menos diversificada do que os microbiomas dos voluntários sem covid longa ou do grupo controle, que não foram contaminados.
A composição da microbiota intestinal na admissão foi associada à ocorrência da covid-19 longa. Pacientes que não tiveram covid longa apresentaram perfil de microbioma intestinal recuperado em 6 meses quando comparado ao grupo controle.
O microbioma intestinal de pacientes que apresentaram manifestações clínicas recorrentes foi caracterizado por níveis mais altos de bactérias patogênicas, como Bacteroides vulgatus, Ruminococcus gnavus e níveis reduzidos de bactérias benéficas, como Faecalibacterium prausnitzii, que possui propriedades imunomoduladoras.
A existência de bactérias produtoras de butirato foram correlacionadas com o teste de caminhada realizado pelos pacientes que participaram do estudo, sugerindo a importância das funções desenvolvidas por esses micro-organismos na redução de complicações sistêmicas após infecções agudas.
Os dados descobertos com a pesquisa parecem estar de acordo com estudos realizados anteriormente, que relatam perturbações da microbiota intestinal em doenças metabólicas, gastrointestinais, crônicas, como doenças inflamatórias, e até neurológicas.
Ainda são necessários mais estudos sobre microbioma e covid-19 longa
Segundo os pesquisadores, esse é o primeiro estudo a demonstrar a relação entre o desequilíbrio da microbiota intestinal e a covid-19 longa após 6 meses de infecção. O estudo pode apresentar limitações.
Essas descobertas podem fornecer evidências sobre a complexa associação entre o microbioma intestinal e as sequelas após a infecção por covid-19, além de ser uma importante ferramenta na estratificação de risco precoce da doença.